Safra em "desajuste" ao que foi investido nela

A mÍdia voltou a dar holofotes para a esquecida Tati Quebra Barraco no passado mês que transcorreu até a porta do fechamento do ano. Não para lançar novo álbum ou single, aproveitando o novo boom que seu gênero musical vem tendo, e sim acendendo-se à frente dela as luzes dos palcos que exibem as tragédias nossas de cada dia. Paralelamente às criticas ao possivelmente digno procedimento das forças policiais, a sub-celebridade, ao se questionar acerca de onde teria errado para que o filho se engajasse no mundo do crime que lhe rapinou a vida, deu um passo inicial na compreensão de como seu trabalho de fato (independentemente dos ganhos materiais) edificou sua própria estrutura familiar e a de grande parte do público, restando a atuação dos conhecedores desta verdade em clarificar perante a artista a resposta de sua interrogação.

A primeira incursão dessas mentes esclarecidas quanto à realidade desabrochou rumo à fanpage de Tati no Facebook logo após a morte de Yuri Lourenço da Silva, aos 19 anos. Com exceção a ofensas racistas e outros ataques que terão extrapolado a meta da ofensiva – expor a real cara do movimento artístico no carregamento de cuja bandeira pelo país a quebradora de barracos é só uma força atuante –, ela precisará, após o respeitável regime (variante de uma pessoa para outra) de abrandamento do pesar inerente ao luto, levar em conta os pontos de vista deslegitimadores da livre presença do funk na sociedade que frequentemente surgem na mídia, majoritariamente nas diversas plataformas informativas e murais de ideias da internet.

Tati Quebra Barraco e outros cantores e bandas (dentre as quais um bom exemplo foi o Bonde do Tigrão) foram, no começo da década passada, o marco zero de um reforço na degradação de uma modalidade de música com pré-existentes vácuos na honra de sua identidade, não mais restrito à corrente melódica. Sob esse horizonte o funk, após ter roubado a denominação de um gênero dos EUA com o qual nenhum parentesco tem, passou a receber um enchimento ideológico lucrativo só a quem o injeta. Condutas sexuais inconsequentes e hedonistas, uso de drogas, mais recentemente o materialismo irracional ("ostentação") e a violência por vezes capaz de se relacionar à busca destas benesses expropriaram no estilo quase todo o espaço do qual poderiam partir valores alternativos mais saudáveis com destino a uma significante cifra de ouvintes, estando nos presentes dias a também colonizar outras vertentes já dispersas quanto a seu papel na cultura interiorana brasileira, a música sertaneja, a afro-brasileira de procedência baiana e o forró.

Na base de apoio com dolo eventual das esferas públicas e da mídia, tanto estatal quanto privada, quando não conclamam ostensivamente o povo a tomarem autêntica consciência englobando o fatídico significado do fenômeno, sua progressão se realiza. Evoluem com o aperfeiçoamento dos mecanismos motores do esquema os ganhos materiais de seus promotores e a diversidade de meios culturais em que representantes possam ser aliciados através das chances de fartura para integrar o processo. Para direções opostas a circunstância impulsiona a capacidade de inúmeros indivíduos, de quaisquer idades, em todo grupo social e entre todos os níveis de renda, regularem o gozo de suas paixões segundo até onde não lesam a terceiros.

Detalhes circundando o tombamento de Yuri na Cidade de Deus em 11 de dezembro como muito provável soldado do tráfico numa batalha da crônica guerra com a polícia carioca fornecem uma amostra do vasto contingente humano susceptível à deletéria influência da forma como sua mãe e quase a totalidade restante dos funkeiros usa o talento artístico, muita gente, sobretudo jovem, habitante tanto de barracos quanto mansões que teve quebradas a golpes de "pancadão" as expectativas sobre si orbitantes de iniciação em caminhos honestos para a felicidade. Na companhia do jovem criado em berço de fartura caíra durante o conflito Jean Rodrigues de Jesus, crescido sem os privilégios até os 22 anos que aí terminavam. A descrenças em torno do envolvimento de ambos na movimentação reserva-se diminuto espaço frente o forte poder influenciador do achado com os jovens de uma pistola 9mm israelense e uma batelada de maconha e cocaína. A forma puramente passional de viver a vida pregada pelo batidão dera o majoritário palpite sobre que itnerário os rapazes poderiam trilhar, com efeito demolidor sobre ao menos unilateralmente benéficas barreiras ao convívio mútuo em ambiente hostil e ainda por cima agindo para mantê-lo assim.

Em sintonia com o que é esperado que Tati tenha lhe desejado, segundo os anseios de todo pai e mãe, a Yuri também se dispunham opções de instrução e trabalho, reforçada essa disponibilidade de alternativas por aqui e no exterior pelo certamente amplo patrimônio ao dispor do iniciante varão que o poderia converter em atitudes para minorar na medida do possível as injustiças manifestas no Brasil (incluindo as favelas, de onde muito provavelmente brotara Jean) e no resto do globo. Plausíveis indícios há de que os atributos da fonte falaram mais alto no desenvolvimento das aspirações do emergente cidadão que a vasta receita captada pela genitora, lhe sendo cobrado agora o preço da escolha ocupacional que, acrescentemos, hoje menos rende a ela e à família em virtude dos novos "talentos" a nascer no segmento fonográfico. A peça em falta para fechar a incógnita levantada por Tati é sua capitulação perante a realidade de a intensa exposição ao ideário de seu repertório ter moldado as vontades do descendente, direcionando-o para junto de indivíduos há muito tempo lesados pelo consumo de dito produto cultural em razão de se terem desenvolvido sob muito menores estímulos a serem alguém prestativo e respeitável na vida.

Nenhuma das necessidades com as quais todo ser humano se depara desde nascido têm poder de autossuprimento. Sobre o sujeito ou seus tutores, quando ainda sem vigor intelectual útil a deliberações pesadas com autonomia, isso lança a missão de esforçar-se para cobrir as diversas carências sob a condição de que a cada uma se dê uma importância que não deixe as outras desassistidas. Contra Tati Quebra Barraco se voltaram suas inoperâncias no sustento desta constante de equilíbrio, vindas dos absurdos para cuja disseminação ela recebeu muito dinheiro com o qual só pudera oferecer ao filho comida, brinquedos (no tempo da infância) e roupas de primeira, negligenciando-lhe a inculcação de princípios que dele fariam um brasileiro digno. Nem tudo que um ser humano possa desejar se adequa ao compromisso de muitos com a liderança de famílias, principalmente no que se refere à prole. Resta mais alguma evidência da relatividade na harmonia de tal relação os brasileiros assimilarem-na e atentarem-se para ela no curso de suas escolhas?

(Referências:
http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/filho-de-tati-quebra-barraco-e-baleado-e-morre-na-cidade-de-deus-rio.ghtml

http://extra.globo.com/casos-de-policia/tati-quebra-barraco-recebe-ataques-nas-redes-sociais-apos-morte-do-filho-20630285.html

http://extra.globo.com/casos-de-policia/filho-de-tati-quebra-barraco-sera-enterrado-no-cemiterio-do-pechincha-20630482.html

https://vagalume.com.br/tati-quebra-barraco/)

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